O embotamento dos sentidos

Esboço de um tratado sobre os sentidos a partir de conversas com Dani Sou. O termo “embotamento dos sentidos” é de autoria da Dani Sou.

Percebemos o mundo através dos sentidos. São eles que nos conectam ao mundo exterior. Esse mundo exterior entra em cada pessoa pelos seus sentidos: o tato, o olfato, a visão, a audição, o paladar e quem sabe outros ainda não descobertos.

O ser humano interfere no meio e muita dessa interferência tem relação com a maneira como os sentidos dxs outrxs percebem o mundo. Quando o homem faz do rio um esgoto, ele impõe a merda aos sentidos de quem está próximo do rio. Muitas vezes a razão, através da educação, compreende que algo não vai bem e procura se afastar do rio sujo, mas é quando o mau-cheiro invade seu corpo que a compreensão se dá por completo – a repulsa.

O embotamento, ou a invasão dos sentidos, é comum às diferentes classes sociais, mas em polos opostos. O cheiro forte do perfume da pessoa abastada conflita com o cheiro de merda humana na calçada por onde a pessoa passa rapidamente saíndo de dentro de um automóvel e entrando em algum edifício. A classe média e a classe baixa não conseguem fugir dos sons. Seja o pancadão engolido a seco nas periferias das cidades, seja nas músicas ambiente das lojas de departamentos ou elevadores. Será que xs ricxs conseguem algum silêncio? Só se for através de janelas anti-ruídos, porque quem está na cidade ouve o som intermitente dos carros, eles, que impuseram ao mundo um eterno burburinho dos motores. Quem sabe nos condomínios fechados haja o mais próximo que o mundo consegue do silêncio onde vivem pessoas juntas.

O som alto dos carros com rádios e equipamentos sonoros, ou das motos com motores altíssimos faz pensar na cultura estranha do carro como instrumento de poder, e na música alta também, um pequeno poder, o de gerar incômodo sobre o outro. Quiçá uma sensação de pertencimento fugaz à classe dxs poderosxs.

Vivemos numa época em que o sistema consegue nos dar a ilusão de pertencermos a um mundo de oportunidades e privilégios através da ilusão dos nossos sentidos. O açúcar, o doce, a sobremesa. A classe que não come sobremesa é aquela que mais se empanturra de açúcar. Uma lógica reversa e perversa de pegar a carência e invertê-la, transformando-a em fetiche, em vício.

A inversão simulada da pobreza em riqueza também se manifesta pela visão, com uma parcela enorme da população pobre alisando seus cabelos e pintando-os de loiro, parecendo aos olhos de outrxs pobres, serem ricxs (porque o padrão nos faz pensar que uma pessoa loira pode não ser rica, mas uma pessoa rica é sempre loira). Já as mulheres e homens ricos de verdade têm a possibilidade de pagar por cirurgias plásticas que procuram apagar o tempo dos seus rostos, parecendo, aos olhos iludidos, serem ainda jovens, e sem pereceberem que, com o tempo, apagam também seus traços, suas histórias, suas faces.

Os perfumes presentes em xampús, cremes, sabonetes, sabões de lavar roupas, amaciantes. Esses cheiros tão fortes mas tão naturalizados em nosso cotidiano, servem para lembrar-nos a todxs que não somos animais, que nossos odores devem ser apaziguados e suprimidos. Deve estar na constituição do mundo: “todo ser humano, independentemente de credo, raça ou classe, tem o direito e o dever de ficar cheiroso”. E a qualidade desses odores, o reconhecimento que se tem deles, vai trazer a distinção social. A pessoa de classe baixa tem acesso ao perfume, e ele também é forte, mas a fragrância é o cheiro do dinheiro, do preço, dependendo dela o cheiro forte é sublime ou vulgar. Nesses dois casos, ainda que de modo oposto dentro de uma mesma linguagem (o perfume), as pessoas ainda estão do lado dos civilizados, seja rico ou seja pobre. Caso você cheire a animal, então você pertence à selva, mesmo ela sendo o centro da cidade, essa é uma quase classe social, uma sub-classe, abaixo da baixa.

Do tato, que podemos dizer da violência, das agressões, do estupro? O cúmulo do embotamento desse sentido é a sensação precisa do nosso não acesso ao nosso corpo. No ônibus lotado, nos corpos esmagados um contra o outro, nas taxas exorbitantes de feminicídio, de genocídio da população negra, das pessoas encarceradas – não temos acesso ao nosso corpo, ao nosso tato, à nossa vida. Adeus sensibilidade, a casca fica grossa, ou fica só o couro.

A opressão surge através dos sentidos. Seja através do nosso não-acesso a eles ou através da imposição de informações sensoriais aos nossos sentidos como formas de doutrinação e conformação.

Na cidade isso fica mais evidente, mas é possível notar de muitas formas as opressões aos sentidos em qualquer lugar do Brasil – ou do mundo.

O apelo aos sentidos e ao seu não-descanso gera seres insensíveis, como já nos apontou Georg Simmel, seres amortecidos, exaustos, embotados. E esses seres insensíveis são a cria mais perfeita do capitalismo, pois não tendo acesso aos seus sentidos, não sabem sequer de suas naturezas e, desconhecendo a si mesmos, são incapazes de criar a sua realidade, e por consequência a sua sociedade.

Com os sentidos embotados nos tornamos autômatxs, constantemente invadidxs e estupradxs, ficamos insensíveis e desconhecemos o direito que temos às nossas sensações e à produção de realidade.

Oxum, fala comigo?!

Hoje descobri que sou de Oxum. Ela vem me orientando. Fala comigo, Oxum. Vem no meu sonho sussurrar, como um rio que desce pelas pedras. O que se pode fazer? Fala comigo, Oxum, me usa para limpar os rios. Abre os caminhos das minhas ideias. Como posso ser instrumento de proteção e recuperação dos rios da minha terra?


Eu escuto “derrube o capitalismo” sussurrado em meu ouvido desde que me conheço por gente, agora eu sei, é ela…


Mas como, Oxum, como?

O cheiro das ervas

Abro o forno e em ondas quentes o alecrim, o manjericão e o alho, aquecidos pelo azeite, invadem meu corpo e me trazem uma memória ancestral. Os bosques verde-escuro, as casas de pedra, o fogo. Me lembram do frio e do aquecimento, do acolhimento que o odor da comida dá à minha fome ancestral. E é verdade. Eu como hoje as mesmas plantas que comiam meus ancestrais. O alecrim, o alho… é o mesmo alho! Ou quase? É o mesmo fogo, a mesma batata, o mesmo ser humano que come, no entanto, está tudo diferente. Na estrutura das células mora nossa memória ancestral. No cheiro do alecrim eu percebo que minhas células são antigas, tão antigas quanto a humanidade. 

Hoje vi uma goiabeira em más condições, no meio de um cruzamento, espremida num canteiro apertado, cheia de fuligem e com o cimento impedindo seu crescimento e a absorção de água. Ela, contudo, tinha algumas poucas flores, e se a deixassem em paz ela certamente daria perfeitas goiabas. As mesmas goiabas de sempre. Ou quase.

PASSION FRUIT – A fruta da paixão

O maracujá, eu o desejo tanto! Desde quando ganhei uma muda espero pelo maracujá. O pé é fraco e não deslanchou, mas também não morreu. 

Eu, na ânsia de fazer tudo o que eu podia para melhorar a vida daquele serzinho, ia conduzindo os ramos para um barbante, onde eles poderiam se agarrar e ganhar mundo. Acontece que toda vez que fui querer juntar o ramo do maracujá com o barbante eu enverguei demais o ramo e ele levemente se quebrou. E assim, com minha ansiedade, eu atrasava o rolê dele e, consequentemente, o meu.

Mas agora tem um ramo novo, todo forte. Ele não está indo na direção do barbante, mas está crescendo sem precisar se agarrar em nada! Se eu conseguir não quebrá-lo com minha ansiedade e tudo aquilo que eu acho que é melhor para ele, acho que, quem sabe, eu consiga um dia colher maracujás. É só não tocar nele, não esperar tanto dele, deixar que cresça como e para onde quiser.

É a fruta da paixão, é a flor roxa que nasce no coração dos trouxa! – pensei. Esse é o ensinamento que o  pé de maracujá tem me dado.

O rosto dos vivos e o rosto dos mortos

Sempre me impressionou o rosto dos mortos, como é diferente da expressão da pessoa viva. Parece mesmo outra pessoa, irreconhecível.

Isso me faz pensar que o nosso rosto vivo é composto muito mais pela expressão que damos a ele, através de tensões e relaxamentos, do que alguma natureza, genética ou estética (predominantemente). E quando a pessoa morre é que percebemos que expressão ela dava a si mesma.

Não existe natureza e neutralidade quando se trata da formação do nosso caráter e personalidade. Mas o que de fato a gente escolhe quando formamos nosso ser?

Me parece que escolhemos apenas como lidar com as forças que agem sobre nós, mas jamais essas forças são controladas por nós. E o nosso rosto vivo é o resultado dessa lida.

Já nosso rosto morto é o resultado de nenhuma força e nenhuma lida, é um rosto que jamais conheceremos em vida.

O dilema da organização

Se definimos que as coisas tem seus lugares, então gastamos um bom tempo de vida recolocando as coisas nos seus lugares. 

Se não definimos lugares para as coisas, gastamos um tempão procurando as coisas.

Se definimos lugares para as coisas e não recolocamos elas nos seus lugares, gastamos um tempo enorme de vida  pensando que deveríamos estar colocando as coisas em seus lugares mas não estamos.

E se não definimos lugares mas deixamos que as coisas se acomodem de maneira “espontânea” estamos à mercê da sorte. Bom, mas estamos sempre à mercê da sorte… esse é o dilema da organização. Será que a organização é uma forma de negociar com a sorte?

O chão duro da cidade

Andando pelas ruas de São Paulo vejo pelo chão cabelos, fezes, urina, sangue, porra, pus, saliva, lágrimas, unhas, peças de roupa e sapatos usados. Pedaços de pessoas e pessoas aos pedaços. O chão da cidade é feito de massa humana. Partes que se descolam do ser, tudo no chão na cidade. Partes de corpos inteiros e despedaçados, expostos na sua decomposição, corpos insepultos, desprovidos de qualquer intimidade – no amor, nas necessidades e na morte.

A sensação não é exatamente nojo, o que revira meu estômago é a indignidade, a exposição crua das entranhas das pessoas que sentem fome, frio, e se despedaçam, como eu, mas em público, no chão sujo de outras pessoas.

Cidade politizadora

A cidade fala, a cidade grita, a cidade politiza. E um dos gritos da cidade é, certamente, o pixo! Para ir trabalhar faço um percurso de 17,5 kilometros, nesse caminho vou lendo os pixos, muitos são políticos e politizados, de protesto, de apoio, de questionamento. Muitos estão na muretinha da Raposo Tavares, que está sendo refeita em vários pontos, muitos já foram apagados, mas os que restaram contam a história das lutas na cidade e no país! Não só contam a história como atiçam, participam ativamente da história!

Decidi anotá-los pois são preciosos e fazem parte da minha formação cotidiana. Me mostram uma cidade em luta e toda a resistência que há no dia-a-dia!


GREVE GERAL

TARIFA ZERO, JÁ! (vááárias vezes)

RESPEITE SUA MÃE E MATE UM POLÍTICO

FORA TEMER (mais de 30 vezes, de todas as cores, tamanhos e fontes possíveis)

AÉCIO ODEIA POBRE, E VC?

FORA TEMER MACHISTÃO

CONTRA O AUMENTO

PODER POPULAR

FORA DÓRIA

PERCA SUA VIDA PARA GANHÁ-LA

O CAPITAL É UMA MERDA


– PRISÃO

+ ESCOLA


COTAS JÁ!

LUANA VIVE!

A PRISÃO DO CORPO É A MENTE

ELEIÇÕES GERAIS JÁ (várias vezes e atropelando um monte de pixos e grafites, diga-se se passagem)

REVOLUÇÃO

NÃO SE CALE

APOIO TOTAL À GREVE DOS PROFESSORES!

LUTE

TUDO É MÁGICO ATÉ VIRAR ROTINA

MATE O GOVERNADOR, POR FAVOR!

SEM TESÃO NÃO HÁ SOLUÇÃO

SEMPRE COVARDE… DIABO DE FARDA

VANDALISMO SIM SEU FILHA DA PUTA!

JOÃO DÓRIA SAFADO!

OS MURALISTAS APOIAM A REVOLUÇÃO

KASSAB, QUE VERGONHA O BUSÃO TÁ MAIS CARO QUE A MACONHA!

ALCKMIN, CADÊ A MERENDA?

DATENA, O REI DOS SAFADOS

COMUNIDADE ATIVA (A NA BOLA) 3,50 NÃO!

COPA POLÍCIA REMOÇÃO LUTA

COPA DAS TROPAS

FIFA FEDE

FIFA GO HOME

FIFA AMA PM

PM APOIA GOLPE

NÃO VAI TER GOLPE!

O ESTADO É O GOLPE

TORTURA ACONTECE(U)

TEMER JAMAIS

3,80 NÃO CARAIO

NINGUÉM É + ESCRAVO

VEM VIVER DE VERDADE

O QUE A GENTE PODE VER NOS MUROS DA CIDADE

ARTISTA DE RUA É VILÃO NUM PAÍS ONDE O OPRESSOR É HERÓI!

ÍNDIO A TERRA É SUA

GOLPE É GUERRA

CADÊ A MERENDA?

LUTAR NÃO É CRIME

MORTE AO CAPITAL

A POLÍCIA SÓ VALE O MAL QUE ELA CAUSA

REVOLUÇÃO SECUNDA

FIM DA PM

O ESTADO É UM GOLPE

TEMER Ñ ADIANTA


Para não dizer que tudo é uma maravilha, reporto aqui aqueles pixos que são ofensivos, completamente sem noção ou que tratam de uma política partidária midiática e modinha:


LULA LADRÃO

DILMA CADELA

MORO MITO

No incerto também mora o valor

Fiz descobertas preciosas sobre o amor e o apego. Gostaria de compartilhá-las.

O amor, o fascínio, o mistério, são coisas difíceis de se entender. Daí vem a minha confusão com o apego, que é essa vontade de controlar, de segurar o momento, o tempo, para ver se ganho tempo para conseguir decifrar e assim viver plenamente a experiência do amor, do mistério e do fascínio. Não compreendo o fenômeno porque é imenso, então procuro ter mais tempo, buscando uma visão total desse encontro com o outro, com o mistério, com o amor, com o infinito.

Só que o apego é o oposto desse fenômeno abismal de descoberta de novos universos. Porque é só na experiência da troca e do encontro que o amor se realiza plenamente, e esse encontro é exatamente o que está acontecendo agora. Qualquer tentativa de controlar o tempo e o outro depõe contra o amor.


Se o que busco através do apego a ideias pré-concebidas é eternizar o encontro, é importante reconhecer que é no viver plenamente o encontro  que verdadeiramente eternizo o fascínio, o mistério e o amor. Não pensar num tempo futuro quando estiver vivenciando algo no presente – não me ausentar do presente nem por um instante (ou ao menos enquanto estiver acontecendo um encontro valioso).


O apego é o medo da falta. Se durante um encontro eu ficar pensando que a ausência daquilo vai me fazer falta, o resultado é que, enquanto acontecia o encontro, eu estava pensando no não-encontro.

Os encontros precisam de calma e pressa. Calma para não se desesperar com o futuro e a perda que virá certamente, porque o futuro é a produção do passado. Pressa porque temos consciência do passado e do futuro, da efemeridade da vida. Calma para gozar sensorialamente e intelectualmente de todas as mirabolantes variações do destino, pressa para não perder o tempo da possibilidade. Calma para entender que existe o eterno, mas praticamente nada ao meu redor é eterno; e pressa exatamente porque para nós a eternidade não é nada além de promessas vazias de religiões que mercantilizam o desespero.

Me ensinaram que o valor está no certo, no garantido, mas percebi que no incerto também mora o valor. 

O que Simone e Sartre diriam da nossa geração?

O que podemos fazer com uma geração que sabe, que entende as forças que agem, as forças da exploração, da alienação, da manipulação, mas não ousa questionar. Antes! Prefere questionar o próprio conceito de ética, ou coerência, prefere aceitar a incoerência como condição da nossa época.

Uma nova ética parece se estabelecer quando não se pode exigir nada do outro, inclusive coerência. Uma liberdade individual extrema que nada tem de libertária, estando muito mais próxima de um liberalismo. É “livre” pois pode tudo. É a tirania do individualismo.

Será que foi isso que a era da informação nos trouxe?

Uma enorme capacidade de aceitar, de saber, entender… e aceitar.

A crença profunda e sincera de que é possível criar algo novo sem fazer nada de profundamente diferente.

É um novo paradigma. Antes o desafio era que todxs tivessem acesso à informação, aos conhecimentos, à escola, à internet. Agora o desafio é a informação se transformar em ações que construam um mundo vivível para todxs, e não em controle, estagnação, manipulação e fetichismo.

É importante observarmos esse sistema que cultua tanto o individualismo e a liberdade individual em detrimento do coletivo, mas que quando se trata de dar poderes a esse indivíduo esse sistema, na verdade, o destitui completamente de toda a sua força.

O que podemos esperar das bilhões de pessoas que neste exato momento conseguem compreender que o mundo como o conhecemos está acabando mas não se sentem capazes de fazer absolutamente nada para mudar isso? Uma geração que, incapaz de ser coerente, decidiu decretar num novo acordo (subjetivo e não conversado mas estranhamente consensuado), de que a coerência não é mais algo tão importante. Em tempos contraditórios, nossos pensamentos embalados por um inconsciente coletivo nos acalmam dizendo que ser “contraditório” não é mais algo negativo. Mas, qual é o problema em ser contraditório? Em dizer uma coisa e fazer outra? Qual é o problema se uma pessoa não tiver “palavra”? Que que tem de errado a pessoa combinar e não cumprir? Dizer que vai e não ir? Bom… são reflexões que não têm uma resposta pronta, podem, de fato, representar uma liberdade em relação ao excesso de compromissos que temos que assumir ao longo de nossa vida burocratizada. O ponto é que, abrindo mão desses acordos não declarados de que ter “palavra” é importante, tornamo-nos menos confiáveis para xs outrxs, e com isso construímos menos um mundo colaborativo e vivível para todxs pois não podemos contar uns com xs outrxs para sobrevivermos, tornamo-nos ainda mais dependentes do sistema de exploração em que estamos inseridxs.

Eu queria que Simone e Sartre estivessem aqui, o que diriam dessa geração que ama o existencialismo mas o sepulta todos os dias em quase todas as suas ações? Uma enorme, generalizada e grotesca desresponsabilização por nossas ações e comportamentos é o que vivemos hoje.

Se um dia entendemos que somos responsáveis pelo que somos e, por consequência, pelo que o mundo é, e se essa percepção foi potencialmente revolucionária quando veio à tona (pois nos devolvia nosso poder de ação), hoje essa consciência não respresenta nenhuma ameaça ao status quo. De certa forma foi tirado (ou trocado) de cada um de nós, habitantes da Terra, o poder de acreditar que nossas ações, ou o conjunto delas, é que está acabando com o mundo, e que, por consequência, poderá salvá-lo.

Tendo a acreditar que esse poder foi trocado pelos confortos do capitalismo e do individualismo. Em cada produto, em cada comportamento e em cada atitude (ou não-atitude) vem a certeza de uma aprovação, de uma cumplicidade, vem a destituição da responsabilidade individual e, com ela, a destituição do nosso poder de agir. É uma troca forçada e desleal, mas é uma troca. Temos nossa parte nisso.

Essa desresponsabilização é notável em diversos aspectos da vida, desde o descaso com o meio ambiente, até os hábitos alimentares, de socialização, de consumo e o trato com x outrx. Mas me parece que a principal desresponsabilização está em ter informação e não agir, em saber… e aceitar.