Adeus, São Paulo!

Adeus, São Paulo!

Minha São Paulo querida!

Ah, deu, São Paulo!

Eu já estou de partida.

Eu acreditei no sonho

De uma cidade assim

Você olha o horizonte

E ele não tem fim

Mas isso não é possível

É um sonho irreal

Uma cidade mais justa

Se quem manda é o capital!

Eu planto uma árvore

Na praça faço agricultura

Vem alguém e arranca tudo

E esse alguém é da prefeitura!

Essa cidade é tão dura

Mas também é generosa

Tem gente de tudo que é jeito

Tem o espinho e tem a rosa.

Vejo sempre muito respeito

Muita força e união

Vejo garra e coragem

Vejo amor e revolução

Cada dia um milagre acontece

E eu vibro de tanta emoção

Mas não deixam fluir a prece

Da nossa organização.

É tanto prédio vazio

E tantas pessoas nas ruas

Às vezes faz muito frio

E a coberta é a luz da lua.

Canalizam e asfaltam

Desocupam e demolem

Escolhem a dedo os lugares importantes

E destroem!

NÃO SÃO MONSTROS

Vejam que barbaridade

Esse homem cometeu

Por ciúme ou por ser covarde

Ninguém compreendeu

Disseram que ele é um monstro

E que o ódio o corroeu

Será mesmo um surto isolado

Ou um projeto? Penso eu

Se o feminicídio acontecesse

Uma vez a cada 100 anos

Uma vez a cada 10 anos

Ou até uma vez por ano

Eu até que pensaria:

“Que loucura desse mano!”

Mas é todo santo dia

Mas é todo santo dia

Matar mulher é uma pandemia

O cara que agride a esposa

Não é louco, não

É só mais um cidadão

Da sociedade machista

Os homens que matam mulheres

Não são monstros, não

São meninos bem criados

Educados pela pornografia

Sujeitos que estupram crianças

Não são exceção

São machos saudáveis

Defensores da moral e da família

o homem bate

O homem bate em outro homem

O homem bate na mulher

Na criança

Nos animais

O homem bate contra o muro

Bate o carro

Bate bate bate

Nos negros e nas negras

Bate em idosxs

Bate na mãe, no pai, nx filhx, no irmão e na irmã.

Em tudo o homem bate

Vive num mundo cheio de hematomas que ele criou.

Por que o homem bate?

O homem bate porque pode

Porque bater e poder são quase a mesma coisa.

O homem bate porque foi ensinado

Porque sempre foi recompensado por bater.

Mãos trabalhadoras

Como são belas

As mãos das trabalhadoras

Fortes, musculosas

Delicadas

Bem cuidadas

Arrumam a roupa

Apertam botões

Mexem na bolsa

Quanto tempo leva

Para as mãos ficarem assim?

Torneadas

Esculpidas

Trabalhadas

Mãos de quem as usa

Para fazer a comida

Para fazer acontecer

O mundo ao nosso redor

Quantas coisas essas mãos fizeram?

Quantos cabelos pentearam?

Quantos panos torceram?

Quantas mandiocas já colheram?

Mãos que acalmam e aconselham

Mãos que seguram firme e não soltam.

Valha-me Anhangá!

Você que vê o rio
E quer canalizar
Anhangá vai te afogar!

Você que vê o peixe
E quer logo pescar
Anhangá vai te fisgar!

Você que vê bicho
E só pensa em matar
Anhangá vai te caçar!

Você que vê a mata
E quer derrubar
Anhangá vai te cortar!

Você que vê gente
E já quer explorar
Anhangá vai se vingar!

Você que vê curva
E quer retificar
Anhangá vai te emendar!

Você que vê terra
E já vem asfaltar
Anhangá vai te enterrar!

Você que vê público
E quer privatizar
Anhangá vem te buscar!

Você que está certo
De que nesse mundo
Justiça não há
Quando dormir
E começar a sonhar
Verá o implacável Anhangá.

Ele vem e não há de falhar
Quando ele assobiar
Não adianta correr
Não adianta implorar
Nem tente se esconder
Pois ele há de te achar.

Infinitar

Sempre que nos deparamos com uma concha grande, daquelas espiraladas (tão raras hoje em dia), nosso instinto mais primitivo é lavá-la à orelha.

Isso acontece porque as conchas têm a capacidade de criar infinitos…

Seja qual for o lugar ou situação em que a concha é levada à orelha, ela consegue nos levar para o mar, para o imenso e misterioso mar.

A capacidade de infinitar momentos da vida limitada é a magia inexplicável das conchas espiraladas, e o fato delas virem do mar não deve ser mero acaso.

A sensação de infinitação provavelmente vem do fato de todos termos vindo do infinito, e mais precisamente, no planetinha azul, do mar.

As conchas trazem consigo o infinito, porque carregam sua origem para onde quer que sejam levadas.

Elas não nos deixam esquecer nossa infinitude enquanto vida continuada, enquanto areia na praia e gota no oceano, enquanto pó de estrelas no universo que tem lá fora e aqui dentro.

Infinitar: ação que as conchas espiraladas realizam quando levadas à orelha e escutadas com atenção.