Metrô – o buraco nosso de cada dia

Se a noção de espaço muda (interfere) na noção de tempo, então quem se desloca no espaço também se desloca no tempo. Quem anda muito de metrô, por estar em um não-espaço, um túnel, sem nenhuma conexão com o lugar correspondente na superfície, quem fica muito neste não-lugar tem um pouco do seu tempo roubado. 


Sim, todos que gastam horas no transporte perdem seu tempo de vida pois o não-lugar, ou a falta de qualquer referência de lugar, faz com que as pequenas coisas que variam na cidade – no sempre mesmo percurso – não sejam vistas, vivenciadas. Mesmo sendo o mesmo caminho todo dia, se você olha para a paisagem, sempre algo diferente vai surgir, e isso dá a noção de vida, de movimento, de tempo. 


Esse preto do túnel tem um preço bem alto, nos custa o tempo, que nunca é nosso. Talvez isso seja um dos motivos das pessoas serem tão ansiosas no metrô. Nas linhas que têm a parte aberta, com o metrô correndo na superfície, é perceptível um suspiro de alívio no ar quando o trem sai no túnel e encontra a luz do sol.

impoTEMPOtência

O tempo é um milagre

Só nele eu tenho fé

O tempo passa e isso é certo

O resto é ilusão

Tentativas de eternizar

o efêmero que é insuportável.

O certo é o insuportável

Só nele eu tenho fé

Ele gera o movimento

Que dá algum sentido ao tempo

Para que ele não corra sozinho

Escancarando sem resistência

Quão sem sentido

É a existência.

Para Dona Emma, Dona Adélia e Dona Ana Dulce

Existem tristezas e lágrimas

Que são evitáveis

De certo modo até

Escolhidas.

Outras são abismos:

Saber que o tempo é infinito,

Mas, para os humanos,

Ele acaba…

Para mim e para os meus

(Que é tudo o que eu reconheço

De belo e cheio de sentido e vida)

O fato é que vai acabar.

Eu penso nas gerações

O neto   a neta

O pai     a mãe

O avô    a avó

É tanto tanto tanto amor

E o tempo implacavável

Vai separar

Vai criar o abismo.

E só de pensar… só de saber…

Já dói.

A neta e a avó

Tem pouco tempo

Para trocarem tudo o que podem

Para se conhecerem

Para conviverem.

A natureza é tão dura

e tão bela.

A guerreira que não se cansa

Sua cria ela defende com justiça

A sabedoria que traz

Não é ostentada,

O preço da luta

Não é calculável.

A urgência começa a urgir

O tempo se esgota

O mundo ainda precisa dela

E ela ainda quer lutar.

Dentro dela a vida reluz

Como brilho de diamante.

A proximidade da morte

A faz amar ainda mais a vida

E olhar para tudo com carinho

E gratidão, com cuidado

Com saudade.

Eu olho para ela,

Eu tenho pouco tempo

Para aprender tudo

Para conhecê-la

Para dizer a ela que a amo

E que vou continuar sua obra!