PASSION FRUIT – A fruta da paixão

O maracujá, eu o desejo tanto! Desde quando ganhei uma muda espero pelo maracujá. O pé é fraco e não deslanchou, mas também não morreu. 

Eu, na ânsia de fazer tudo o que eu podia para melhorar a vida daquele serzinho, ia conduzindo os ramos para um barbante, onde eles poderiam se agarrar e ganhar mundo. Acontece que toda vez que fui querer juntar o ramo do maracujá com o barbante eu enverguei demais o ramo e ele levemente se quebrou. E assim, com minha ansiedade, eu atrasava o rolê dele e, consequentemente, o meu.

Mas agora tem um ramo novo, todo forte. Ele não está indo na direção do barbante, mas está crescendo sem precisar se agarrar em nada! Se eu conseguir não quebrá-lo com minha ansiedade e tudo aquilo que eu acho que é melhor para ele, acho que, quem sabe, eu consiga um dia colher maracujás. É só não tocar nele, não esperar tanto dele, deixar que cresça como e para onde quiser.

É a fruta da paixão, é a flor roxa que nasce no coração dos trouxa! – pensei. Esse é o ensinamento que o  pé de maracujá tem me dado.

O rosto dos vivos e o rosto dos mortos

Sempre me impressionou o rosto dos mortos, como é diferente da expressão da pessoa viva. Parece mesmo outra pessoa, irreconhecível.

Isso me faz pensar que o nosso rosto vivo é composto muito mais pela expressão que damos a ele, através de tensões e relaxamentos, do que alguma natureza, genética ou estética (predominantemente). E quando a pessoa morre é que percebemos que expressão ela dava a si mesma.

Não existe natureza e neutralidade quando se trata da formação do nosso caráter e personalidade. Mas o que de fato a gente escolhe quando formamos nosso ser?

Me parece que escolhemos apenas como lidar com as forças que agem sobre nós, mas jamais essas forças são controladas por nós. E o nosso rosto vivo é o resultado dessa lida.

Já nosso rosto morto é o resultado de nenhuma força e nenhuma lida, é um rosto que jamais conheceremos em vida.

O dilema da organização

Se definimos que as coisas tem seus lugares, então gastamos um bom tempo de vida recolocando as coisas nos seus lugares. 

Se não definimos lugares para as coisas, gastamos um tempão procurando as coisas.

Se definimos lugares para as coisas e não recolocamos elas nos seus lugares, gastamos um tempo enorme de vida  pensando que deveríamos estar colocando as coisas em seus lugares mas não estamos.

E se não definimos lugares mas deixamos que as coisas se acomodem de maneira “espontânea” estamos à mercê da sorte. Bom, mas estamos sempre à mercê da sorte… esse é o dilema da organização. Será que a organização é uma forma de negociar com a sorte?

O chão duro da cidade

Andando pelas ruas de São Paulo vejo pelo chão cabelos, fezes, urina, sangue, porra, pus, saliva, lágrimas, unhas, peças de roupa e sapatos usados. Pedaços de pessoas e pessoas aos pedaços. O chão da cidade é feito de massa humana. Partes que se descolam do ser, tudo no chão na cidade. Partes de corpos inteiros e despedaçados, expostos na sua decomposição, corpos insepultos, desprovidos de qualquer intimidade – no amor, nas necessidades e na morte.

A sensação não é exatamente nojo, o que revira meu estômago é a indignidade, a exposição crua das entranhas das pessoas que sentem fome, frio, e se despedaçam, como eu, mas em público, no chão sujo de outras pessoas.

Cidade politizadora

A cidade fala, a cidade grita, a cidade politiza. E um dos gritos da cidade é, certamente, o pixo! Para ir trabalhar faço um percurso de 17,5 kilometros, nesse caminho vou lendo os pixos, muitos são políticos e politizados, de protesto, de apoio, de questionamento. Muitos estão na muretinha da Raposo Tavares, que está sendo refeita em vários pontos, muitos já foram apagados, mas os que restaram contam a história das lutas na cidade e no país! Não só contam a história como atiçam, participam ativamente da história!

Decidi anotá-los pois são preciosos e fazem parte da minha formação cotidiana. Me mostram uma cidade em luta e toda a resistência que há no dia-a-dia!


GREVE GERAL

TARIFA ZERO, JÁ! (vááárias vezes)

RESPEITE SUA MÃE E MATE UM POLÍTICO

FORA TEMER (mais de 30 vezes, de todas as cores, tamanhos e fontes possíveis)

AÉCIO ODEIA POBRE, E VC?

FORA TEMER MACHISTÃO

CONTRA O AUMENTO

PODER POPULAR

FORA DÓRIA

PERCA SUA VIDA PARA GANHÁ-LA

O CAPITAL É UMA MERDA


– PRISÃO

+ ESCOLA


COTAS JÁ!

LUANA VIVE!

A PRISÃO DO CORPO É A MENTE

ELEIÇÕES GERAIS JÁ (várias vezes e atropelando um monte de pixos e grafites, diga-se se passagem)

REVOLUÇÃO

NÃO SE CALE

APOIO TOTAL À GREVE DOS PROFESSORES!

LUTE

TUDO É MÁGICO ATÉ VIRAR ROTINA

MATE O GOVERNADOR, POR FAVOR!

SEM TESÃO NÃO HÁ SOLUÇÃO

SEMPRE COVARDE… DIABO DE FARDA

VANDALISMO SIM SEU FILHA DA PUTA!

JOÃO DÓRIA SAFADO!

OS MURALISTAS APOIAM A REVOLUÇÃO

KASSAB, QUE VERGONHA O BUSÃO TÁ MAIS CARO QUE A MACONHA!

ALCKMIN, CADÊ A MERENDA?

DATENA, O REI DOS SAFADOS

COMUNIDADE ATIVA (A NA BOLA) 3,50 NÃO!

COPA POLÍCIA REMOÇÃO LUTA

COPA DAS TROPAS

FIFA FEDE

FIFA GO HOME

FIFA AMA PM

PM APOIA GOLPE

NÃO VAI TER GOLPE!

O ESTADO É O GOLPE

TORTURA ACONTECE(U)

TEMER JAMAIS

3,80 NÃO CARAIO

NINGUÉM É + ESCRAVO

VEM VIVER DE VERDADE

O QUE A GENTE PODE VER NOS MUROS DA CIDADE

ARTISTA DE RUA É VILÃO NUM PAÍS ONDE O OPRESSOR É HERÓI!

ÍNDIO A TERRA É SUA

GOLPE É GUERRA

CADÊ A MERENDA?

LUTAR NÃO É CRIME

MORTE AO CAPITAL

A POLÍCIA SÓ VALE O MAL QUE ELA CAUSA

REVOLUÇÃO SECUNDA

FIM DA PM

O ESTADO É UM GOLPE

TEMER Ñ ADIANTA


Para não dizer que tudo é uma maravilha, reporto aqui aqueles pixos que são ofensivos, completamente sem noção ou que tratam de uma política partidária midiática e modinha:


LULA LADRÃO

DILMA CADELA

MORO MITO

No incerto também mora o valor

Fiz descobertas preciosas sobre o amor e o apego. Gostaria de compartilhá-las.

O amor, o fascínio, o mistério, são coisas difíceis de se entender. Daí vem a minha confusão com o apego, que é essa vontade de controlar, de segurar o momento, o tempo, para ver se ganho tempo para conseguir decifrar e assim viver plenamente a experiência do amor, do mistério e do fascínio. Não compreendo o fenômeno porque é imenso, então procuro ter mais tempo, buscando uma visão total desse encontro com o outro, com o mistério, com o amor, com o infinito.

Só que o apego é o oposto desse fenômeno abismal de descoberta de novos universos. Porque é só na experiência da troca e do encontro que o amor se realiza plenamente, e esse encontro é exatamente o que está acontecendo agora. Qualquer tentativa de controlar o tempo e o outro depõe contra o amor.


Se o que busco através do apego a ideias pré-concebidas é eternizar o encontro, é importante reconhecer que é no viver plenamente o encontro  que verdadeiramente eternizo o fascínio, o mistério e o amor. Não pensar num tempo futuro quando estiver vivenciando algo no presente – não me ausentar do presente nem por um instante (ou ao menos enquanto estiver acontecendo um encontro valioso).


O apego é o medo da falta. Se durante um encontro eu ficar pensando que a ausência daquilo vai me fazer falta, o resultado é que, enquanto acontecia o encontro, eu estava pensando no não-encontro.

Os encontros precisam de calma e pressa. Calma para não se desesperar com o futuro e a perda que virá certamente, porque o futuro é a produção do passado. Pressa porque temos consciência do passado e do futuro, da efemeridade da vida. Calma para gozar sensorialamente e intelectualmente de todas as mirabolantes variações do destino, pressa para não perder o tempo da possibilidade. Calma para entender que existe o eterno, mas praticamente nada ao meu redor é eterno; e pressa exatamente porque para nós a eternidade não é nada além de promessas vazias de religiões que mercantilizam o desespero.

Me ensinaram que o valor está no certo, no garantido, mas percebi que no incerto também mora o valor. 

O que Simone e Sartre diriam da nossa geração?

O que podemos fazer com uma geração que sabe, que entende as forças que agem, as forças da exploração, da alienação, da manipulação, mas não ousa questionar. Antes! Prefere questionar o próprio conceito de ética, ou coerência, prefere aceitar a incoerência como condição da nossa época.

Uma nova ética parece se estabelecer quando não se pode exigir nada do outro, inclusive coerência. Uma liberdade individual extrema que nada tem de libertária, estando muito mais próxima de um liberalismo. É “livre” pois pode tudo. É a tirania do individualismo.

Será que foi isso que a era da informação nos trouxe?

Uma enorme capacidade de aceitar, de saber, entender… e aceitar.

A crença profunda e sincera de que é possível criar algo novo sem fazer nada de profundamente diferente.

É um novo paradigma. Antes o desafio era que todxs tivessem acesso à informação, aos conhecimentos, à escola, à internet. Agora o desafio é a informação se transformar em ações que construam um mundo vivível para todxs, e não em controle, estagnação, manipulação e fetichismo.

É importante observarmos esse sistema que cultua tanto o individualismo e a liberdade individual em detrimento do coletivo, mas que quando se trata de dar poderes a esse indivíduo esse sistema, na verdade, o destitui completamente de toda a sua força.

O que podemos esperar das bilhões de pessoas que neste exato momento conseguem compreender que o mundo como o conhecemos está acabando mas não se sentem capazes de fazer absolutamente nada para mudar isso? Uma geração que, incapaz de ser coerente, decidiu decretar num novo acordo (subjetivo e não conversado mas estranhamente consensuado), de que a coerência não é mais algo tão importante. Em tempos contraditórios, nossos pensamentos embalados por um inconsciente coletivo nos acalmam dizendo que ser “contraditório” não é mais algo negativo. Mas, qual é o problema em ser contraditório? Em dizer uma coisa e fazer outra? Qual é o problema se uma pessoa não tiver “palavra”? Que que tem de errado a pessoa combinar e não cumprir? Dizer que vai e não ir? Bom… são reflexões que não têm uma resposta pronta, podem, de fato, representar uma liberdade em relação ao excesso de compromissos que temos que assumir ao longo de nossa vida burocratizada. O ponto é que, abrindo mão desses acordos não declarados de que ter “palavra” é importante, tornamo-nos menos confiáveis para xs outrxs, e com isso construímos menos um mundo colaborativo e vivível para todxs pois não podemos contar uns com xs outrxs para sobrevivermos, tornamo-nos ainda mais dependentes do sistema de exploração em que estamos inseridxs.

Eu queria que Simone e Sartre estivessem aqui, o que diriam dessa geração que ama o existencialismo mas o sepulta todos os dias em quase todas as suas ações? Uma enorme, generalizada e grotesca desresponsabilização por nossas ações e comportamentos é o que vivemos hoje.

Se um dia entendemos que somos responsáveis pelo que somos e, por consequência, pelo que o mundo é, e se essa percepção foi potencialmente revolucionária quando veio à tona (pois nos devolvia nosso poder de ação), hoje essa consciência não respresenta nenhuma ameaça ao status quo. De certa forma foi tirado (ou trocado) de cada um de nós, habitantes da Terra, o poder de acreditar que nossas ações, ou o conjunto delas, é que está acabando com o mundo, e que, por consequência, poderá salvá-lo.

Tendo a acreditar que esse poder foi trocado pelos confortos do capitalismo e do individualismo. Em cada produto, em cada comportamento e em cada atitude (ou não-atitude) vem a certeza de uma aprovação, de uma cumplicidade, vem a destituição da responsabilidade individual e, com ela, a destituição do nosso poder de agir. É uma troca forçada e desleal, mas é uma troca. Temos nossa parte nisso.

Essa desresponsabilização é notável em diversos aspectos da vida, desde o descaso com o meio ambiente, até os hábitos alimentares, de socialização, de consumo e o trato com x outrx. Mas me parece que a principal desresponsabilização está em ter informação e não agir, em saber… e aceitar.

Frankstein fascista

Essa noite tive um sonho revelador.


Estávamos no meio de um tiroteio, parecia o Rio de Janeiro (acho que fui influenciada pela intervenção federal militar). Eu tentava levar algumas crianças para algum lugar seguro. Atravessamos o tiroteio e nos abrigamos em uma casa. Tudo era uma grande guerra. Pânico generalizado. Mas eu respirava aliviada porque tinha conseguido entrar em uma casa. Da garagem dessa casa, eis que surge um grande monstro. Um Frankstein. Ele era levado pela mão por um dos nossos. Um grande silêncio se fez. Pavor total. Que nem o Jaspion e todas as séries japonesas, que depois que eles conseguiam matar o inimigo surgia uma versão ainda maior e mais perigosa. O monstro tinha despertado e estava à solta, o exército estava com ele. Foi então que ele veio na minha direção. Ele tinha uma metralhadora. Eu achei que ia morrer, consegui pegar uma vassoura vermelha que estava por perto. Ele veio na minha direção. Fechei os olhos e enfiei com toda a minha força a vassoura no pescoço dele. Nunca imaginei que teria força para isso. Ele não me matou. Não sei se o matei.


Acordei, de novo a realidade da ascensão do fascismo ronda o mundo. Candidatos e governantes assumidamente racistas, homofóbicos, machistas, xenofóbicos inundam as notícias logo pela manhã. 


Minha interpretação do sonho: se algo em mim ainda não estava se conformando com essa realidade tão boçal, agora até minhas camadas mais incoscientes já se deram conta de que é isso mesmo. Lá de dentro, de lugares longínquos da minha mente, veio a única mensagem que ainda faz sentido: é preciso enfrentar, lutar. Eles têm armas, eles têm monstros, mas se eu mirar na jugular, eu terei uma chance.

Nosso acccordo

Eu não perdôo

E guardo rancor

De quem,

Estando em posição de lutar,

E tendo condições para isso,

Recua e não age

Não se responsabilizando

pelo mundo em que nasceu.


O que nos deixou tão insensíveis?

Quando exatamente ficamos assim?


Deve ter sido quando firmamos

um acordo irrevogável com 

o comodismo,

o conformismo 

o confortismo.


QUAL SERÁ A DANÇA DO FIM DO MUNDO?

O SAMBA DOS HELICÓPTEROS?

O XOTE DO CHICOTE?

O FUNK DAS METRALHADORAS?

Todos tocando ao mesmo tempo

no volume máximo!

FUNK SENSACIONALISTA

Escrito com Vanessa Medeiros

Cidade Alerta

Brasil Urgente

Lixo em nossa mente aberta

Embrutecendo a gente


Polícia ou bandido

De que lado você está?

Sinta que delícia

Ver o sangue jorrar


Carne negra na TV

Não identificada

A polícia está fardada

E a quebrada encarcerada


Sinta o poder

De ser juíz ao vivo

Mata mata mata

Mata que ele é bandido


Nos deixando apavorados

Despertando nosso ódio

Da barbárie, os soldados

6 da tarde nosso ópio


Violência é lucro 

Qual é a morte do dia?

Pensamento xucro

Diversão é agonia!