A vida é uma batucada

O tempo, o ritmo. Tudo tem um tempo e um ritmo. O ideal é conseguir, em cada contato, escutar o ritmo e respeitar o tempo (o seu próprio, o dx outrx e o do encontro). No entanto, a ansiedade parece um botão de forward no nosso tempo. Eu não conheço bem meu tempo, eu só o sinto, mas não tenho controle sobre ele, e nem sobre as coisas que influenciam meu tempo, como as obrigações, as situações com as pessoas…

O tempo da fala não é o mesmo do pensamento.

E o tempo do pensamento não é o mesmo do sentimento.

Pro sentimento virar pensamento leva um tempo.

E pro tempo conseguir levar um sentimento, precisa de muito pensamento.

Mas, se tudo tem tempo e ritmo, a gente nunca está paradx, é só aguçarmos a escuta que uma música se organiza e uma dança a acompanha.

Eu escuto o mar batendo, as ondas suaves. Domingo em SP. As ondas são carros que passam ao longe e rasgam o ar, como as ondas. O burburinho ao longe, eu juro que é parecido.

Nos dias de semana, a cidade pela manhã, o som é tão louco.  É tão claro o momento em que começa o ronronar dos motores, no começo mais esparsos, sons de carros passando, depois uma massa sonora, um diapasão, o tom do dia é dado pelos motores. Parece que o sol veio e apertou o botão que liga a máquina una, aquela que começa a funcionar quando todas as máquinas estão funcionando juntas.

O ritmo das pessoas é diferente. Mesmo entrando no ritmo da cidade, ou da aldeia, cada pessoa carrega seu ritmo, seu tempo. E na verdade cada pessoa pode ter vários ritmos… e eles podem ir mudando. Não é uma questão de entender, porque entender é impossível, mas de sentir, de pulsar, de batucar junto.

Metrô – o buraco nosso de cada dia

Se a noção de espaço muda (interfere) na noção de tempo, então quem se desloca no espaço também se desloca no tempo. Quem anda muito de metrô, por estar em um não-espaço, um túnel, sem nenhuma conexão com o lugar correspondente na superfície, quem fica muito neste não-lugar tem um pouco do seu tempo roubado. 


Sim, todos que gastam horas no transporte perdem seu tempo de vida pois o não-lugar, ou a falta de qualquer referência de lugar, faz com que as pequenas coisas que variam na cidade – no sempre mesmo percurso – não sejam vistas, vivenciadas. Mesmo sendo o mesmo caminho todo dia, se você olha para a paisagem, sempre algo diferente vai surgir, e isso dá a noção de vida, de movimento, de tempo. 


Esse preto do túnel tem um preço bem alto, nos custa o tempo, que nunca é nosso. Talvez isso seja um dos motivos das pessoas serem tão ansiosas no metrô. Nas linhas que têm a parte aberta, com o metrô correndo na superfície, é perceptível um suspiro de alívio no ar quando o trem sai no túnel e encontra a luz do sol.

impoTEMPOtência

O tempo é um milagre

Só nele eu tenho fé

O tempo passa e isso é certo

O resto é ilusão

Tentativas de eternizar

o efêmero que é insuportável.

O certo é o insuportável

Só nele eu tenho fé

Ele gera o movimento

Que dá algum sentido ao tempo

Para que ele não corra sozinho

Escancarando sem resistência

Quão sem sentido

É a existência.

O amor e a cidade


Onde tantos transitam

Transitam muitos interesses

Olhar, ver, perceber

Captar o momento, o rosto e as feições de quem passa


Então passa


Infinitamente maior do que o tempo do encontro

(cruzamento, não como o dos animais)

É o tempo eterno do nunca mais


Por isso o treino do desinteresse

O encontro, o momento de iluminação do belo transeúnte

 é esmagado por todos os outros que passam,

pelo tempo posterior que o devora.


Mas o treino não funciona sempre

A vida procura vida

Os olhos procuram olhos

E sorrisos explodem sorrisos


Na metrópole está tudo o que se busca

Mas quase nada está ao alcance das mãos.