O que podemos fazer com uma geração que sabe, que entende as forças
que agem, as forças da exploração, da alienação, da manipulação, mas não
ousa questionar. Antes! Prefere questionar o próprio conceito de ética,
ou coerência, prefere aceitar a incoerência como condição da nossa
época.
Uma nova ética parece se estabelecer quando não
se pode exigir nada do outro, inclusive coerência. Uma liberdade
individual extrema que nada tem de libertária, estando muito mais
próxima de um liberalismo. É “livre” pois pode tudo. É a tirania do
individualismo.
Será que foi isso que a era da informação nos trouxe?
Uma enorme capacidade de aceitar, de saber, entender… e aceitar.
A crença profunda e sincera de que é possível criar algo novo sem fazer nada de profundamente diferente.
É
um novo paradigma. Antes o desafio era que todxs tivessem acesso à
informação, aos conhecimentos, à escola, à internet. Agora o desafio é a
informação se transformar em ações que construam um mundo vivível para
todxs, e não em controle, estagnação, manipulação e fetichismo.
É
importante observarmos esse sistema que cultua tanto o individualismo e
a liberdade individual em detrimento do coletivo, mas que quando se
trata de dar poderes a esse indivíduo esse sistema, na verdade, o
destitui completamente de toda a sua força.
O que
podemos esperar das bilhões de pessoas que neste exato momento conseguem
compreender que o mundo como o conhecemos está acabando mas não se
sentem capazes de fazer absolutamente nada para mudar isso? Uma geração
que, incapaz de ser coerente, decidiu decretar num novo acordo
(subjetivo e não conversado mas estranhamente consensuado), de que a
coerência não é mais algo tão importante. Em tempos contraditórios,
nossos pensamentos embalados por um inconsciente coletivo nos acalmam
dizendo que ser “contraditório” não é mais algo negativo. Mas, qual é o
problema em ser contraditório? Em dizer uma coisa e fazer outra? Qual é o
problema se uma pessoa não tiver “palavra”? Que que tem de errado a
pessoa combinar e não cumprir? Dizer que vai e não ir? Bom… são
reflexões que não têm uma resposta pronta, podem, de fato, representar
uma liberdade em relação ao excesso de compromissos que temos que
assumir ao longo de nossa vida burocratizada. O ponto é que, abrindo mão
desses acordos não declarados de que ter “palavra” é importante,
tornamo-nos menos confiáveis para xs outrxs, e com isso construímos
menos um mundo colaborativo e vivível para todxs pois não podemos contar
uns com xs outrxs para sobrevivermos, tornamo-nos ainda mais
dependentes do sistema de exploração em que estamos inseridxs.
Eu
queria que Simone e Sartre estivessem aqui, o que diriam dessa geração
que ama o existencialismo mas o sepulta todos os dias em quase todas as
suas ações? Uma enorme, generalizada e grotesca desresponsabilização por
nossas ações e comportamentos é o que vivemos hoje.
Se
um dia entendemos que somos responsáveis pelo que somos e, por
consequência, pelo que o mundo é, e se essa percepção foi potencialmente
revolucionária quando veio à tona (pois nos devolvia nosso poder de
ação), hoje essa consciência não respresenta nenhuma ameaça ao status
quo. De certa forma foi tirado (ou trocado) de cada um de nós,
habitantes da Terra, o poder de acreditar que nossas ações, ou o
conjunto delas, é que está acabando com o mundo, e que, por
consequência, poderá salvá-lo.
Tendo a acreditar que
esse poder foi trocado pelos confortos do capitalismo e do
individualismo. Em cada produto, em cada comportamento e em cada atitude
(ou não-atitude) vem a certeza de uma aprovação, de uma cumplicidade,
vem a destituição da responsabilidade individual e, com ela, a
destituição do nosso poder de agir. É uma troca forçada e desleal, mas é
uma troca. Temos nossa parte nisso.
Essa
desresponsabilização é notável em diversos aspectos da vida, desde o
descaso com o meio ambiente, até os hábitos alimentares, de
socialização, de consumo e o trato com x outrx. Mas me parece que a
principal desresponsabilização está em ter informação e não agir, em
saber… e aceitar.