Não podemos esperar a nossa morte para alimentar a terra que nos alimenta.
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Ensinamento 4
É preciso muito cuidar antes e depois de plantar. É preciso plantar muito para colher um pouco. Nem todas as plantas conseguem chegar na sua maturidade e dar frutos, mas aquelas que morrem no caminho alimentam as que conseguem se desenvolver plenamente.
INGRITOS NO METRÔ
O metrô de dia de semana, mais claramente de manhã cedo, tem um silêncio de morte. A massa taciturna e ensimesmada segue seu trilho, sua trilha de gado com a cabeça baixa e a boca cerrada.
De sábado é outra história, outro som. As pessoas animadas, acompanhadas de família, amigues, etc, falam alto, riem, gesticulam.
Não há rebanho aos sábados, mesmo tendo bastante gente no metrô.
No sábado há vida porque as pessoas retomam suas vozes, seus sorrisos, suas vidas.
Essa discrepância entre os dias de semana, que representam a morte, o suicídio cotidiano, e o fim de semana, que é o pouco tempo que temos para tentarmos ser nós mesmas, essa contradição não pode ser ignorada, naturalizada.
O som e a atitude das pessoas no metrô são muito sintomáticos da vida tal como está organizada, e das nossas grades invisíveis. A morte vaza pelos buracos dos corpos, o banho pela manhã, a roupa limpa com cheiro de amaciante, o desodorante, nada consegue disfarçar o cheiro da morte que as pessoas emanam com seu silêncio, com os gritos para dentro. Ingritos.
Para Dona Emma, Dona Adélia e Dona Ana Dulce
Existem tristezas e lágrimas
Que são evitáveis
De certo modo até
Escolhidas.
Outras são abismos:
Saber que o tempo é infinito,
Mas, para os humanos,
Ele acaba…
Para mim e para os meus
(Que é tudo o que eu reconheço
De belo e cheio de sentido e vida)
O fato é que vai acabar.
Eu penso nas gerações
O neto a neta
O pai a mãe
O avô a avó
É tanto tanto tanto amor
E o tempo implacavável
Vai separar
Vai criar o abismo.
E só de pensar… só de saber…
Já dói.
A neta e a avó
Tem pouco tempo
Para trocarem tudo o que podem
Para se conhecerem
Para conviverem.
A natureza é tão dura
e tão bela.
A guerreira que não se cansa
Sua cria ela defende com justiça
A sabedoria que traz
Não é ostentada,
O preço da luta
Não é calculável.
A urgência começa a urgir
O tempo se esgota
O mundo ainda precisa dela
E ela ainda quer lutar.
Dentro dela a vida reluz
Como brilho de diamante.
A proximidade da morte
A faz amar ainda mais a vida
E olhar para tudo com carinho
E gratidão, com cuidado
Com saudade.
Eu olho para ela,
Eu tenho pouco tempo
Para aprender tudo
Para conhecê-la
Para dizer a ela que a amo
E que vou continuar sua obra!
Dona Lúcia
As histórias daqueles que não foram famosos, celebridades, lideranças, daqueles que trabalharam e só trabalharam, que criaram seus filhos com sacrifício, essas histórias, se não forem escritas ou gravadas, serão esquecidas?
A vida cotidiana sem muito brilho e oportunidades para homenagens e solenidades , as vidas das milhões de pessoas que todo dia levantam cedo e vão trabalhar para mover este sistema, essas vidas acabarão e um dia será como se nunca tivessem existido?
Minha mãe, meu pai, minha avó, D. Lúcia, D. Adélia… quem vai registrar essas histórias? Ou será que faz parte dessa vida passarmos, assim, sem marcas, como um rio suavemente corre em seu leito, e só o trabalho de muitos, como o volume de água do rio, é que traz as transformações?
Por medo de esquecer, em homenagem à D. Lúcia, vou deixar escrito algumas coisas que sei dela:
– era camponesa, japonesa, só sabia escrever e ler em japonês, era órfã e foi criada pelo seu tio, trabalhou desde criança, teve dois filhos e seis netos. Era justa, simples, guardava tudo com cuidado porque sabia o que era a falta. Sabia costurar, era ótima de conversa, tinha boa memória. Dizia Prudente Prudente em vez de Presidente Prudente, tinha pouca vaidade mas estava sempre muito limpinha e penteada. Quando mais nova fazia permanente. Nunca a ouvi levantar a voz. Agradecia a cada refeição – obrigada!
Por enquanto me lembro de muitas coisas, não vou escrever tudo porque daria um livro. Espero não me esquecer!
D. Lúcia era minha amiga, e quem disse isso foi ela! Eu concordei!